quinta-feira, março 22, 2012

O ignorante e o ignorado


Menina Bonita era muito sonhadora e parecia que demorava para cair na real sobre a forma como as coisas eram de fato. Passou tempos vivendo frustrações de momentos em que via coisas acontecerem de forma cruel e violenta, coisa que, para ela, ninguém aguenta. Quem tinha sempre achava que podia e temia, e quem não tinha, tinha certeza de que podia viver, sonhar e se realizar.

Um dia Menina Bonita sonhou com uma situação inusitada. Veja só que curioso, um Trocador de ônibus, desses que se dá bom dia e tudo, recebeu, no seu carro, um Cara Valente, desses que exibem toda a sua pseudo-valentia, travestido numa máscara de arrogância. O encontro foi assim:

Trocador: Bom dia, meu rapaz.
Cara Valente: Por que falas comigo? Faz o teu serviço, pega esse dinheiro, dá o troco e acaba logo com isso. Quero passar.

Surpreso com a “bem humorada” reação, tentou quebrar a attitude violenta com uma resposta inesperada.
Trocador: Quanta violência, homem de bem. Tenha certeza que isso te impede de ir além.

Certo de que o trocador estava fazendo piada, o cara responde querendo mostrar que era superior.
Cara Valente: Sei bem onde vou e nada me impede de chegar onde quero. Tenho dinheiro, café e minério. Ninguém desbanca o meu império.

Com uma prepotência desalmada, de dar vergonha a qualquer monarca, esse cara não conseguiu abalar o bem estruturado Trocador.
Trocador: Vê-se que se trata de um cego. De que vale todo esse império se não tem olhos para observar, ouvidos de sentir e alma para viver?

Sem entender nada, o Cara Valente percebeu que aquela conversa não iria levar a lugar algum. Decidiu continuar na ignorância verbal e ignorar tudo o que o simpático trocador lhe falava.
Cara Valente: Faça o favor de falar com outro passageiro. Dá o meu troco que não aguento mais sentir o teu cheiro. Não preciso de você.

A essa altura, Trocador já sabia que mal maior não havia. Como este, existiam muitas outras pessoas que não sabem ou podem ouvir, e logo demonstram seu poder. Tinha certeza de que esses atos eram uma demonstração de fraqueza e falta de riqueza. Não quis mais tentar convencer o suposto poderoso da sua real falta. Respondeu, torcendo por mais estrutura na vida daquele pobre cara rico.
Trocador: Então vá seu moço. Boa sorte!

Maluca que era, Menina Bonita acordou, pensou, fez que não, deu uma risadinha e foi viver no mundo real. Torcia para não encontrar um cara valente à frente.

Nenhum comentário: